Frame de Bichos Pretos Coloridos (2011), de Karim Aïnouz
Capturar o verde da floresta.
Percorrer de um gesto o verde da floresta.
Apagar o verde da floresta.
Acrescentar o verde da floresta à floresta mesma.
Giuseppe Penone
O encontro entre uma mulher e um homem, a céu aberto, diante de uma cachoeira cercada por uma vegetação radical, são, a partir desse instante, os corpos que chamaremos de bichos [2].
Aspectos dramáticos:
– ela, estatura mediana, entre 50 e 60 anos;
– ele: estatura mediana, entre 50 e 60 anos.
A cena começa. Destituídos de qualquer interioridade, nada têm a expressar, a reter ou ocupar, antes preferem povoar a água da torrente que vaza. Esverdeiam-se, acinzentam a mata que cresce atlântica entre, ao redor, sobre eles. Suas genitálias equilibram a temperatura do ambiente, além de amaciarem os dedos que sobre elas passeiam e penetram. Esses órgãos dionisíacos são elementos que os conectam física e afetivamente. Do desenho aos corpos da cena, tudo fica escancarado como um céu aberto. Eles parecem meio piratas, desbravando as terras estrangeiras que lhes cercam, desbravando inclusive a eles mesmos. A simplicidade ganha seu diagnóstico de selvagem, e isso ocorre porque a obra Bichos Pretos Coloridos retorna conscientemente a uma tradição teatral em que os gestos [3] fissuram a soberania da palavra, elemento que sustenta parte relevante dos sistemas ocidentais de significação, quando instaura sua própria lógica alçando o corpo como usina de produção sígnica e, por esse motivo, institucionalmente legítima. Em vez de permanecerem no gozo das oposições [4], os bichos desenham nos movimentos que fazem ou deixam de fazer em uma coreografia afetiva através do inusitado de suas bocas, pênis e vagina. Ao decidir suspender a autoridade da linguagem falada, apostam, portanto, nos atos gestuais, queremos dizer, na ação que nasce com a mão, com o instante, com a sensação, com o gemido.
Não é por acaso que Nietzsche [5] acreditava que toda cultura forte tem como princípio o que vem do corpo, firmando-se ao longo do tempo em gestos, no orgânico e no manifesto. A poética gestual, dizia ele, algum dia nos serviu como uma tecnologia para que vivenciássemos o mundo desconhecido de algumas emoções. Imitar para conhecer, repetir para refazer as sensações. [6] Contra as latências oceânicas legadas por uma cultura europeia romântico-burguesa, o pensamento nietzschiano celebrará a experiência das superfícies: aquela que é maquinada de corpo para corpos, recusando qualquer experimentação que negue a força do pensar/sensação. Munido de artefatos manuais (martelo, espada) e de um extenso bestiário (poeta, águia, filósofo, camelo), ele acolherá outras místicas filosóficas para a composição de sua arte-pensamento a fim de romper com transcendências que lancem o sujeito para um além do corpo.
Os bichos fundam sua civilização e barbárie ao mesmo tempo que reúnem, sem fronteiras opositivas, sexo e afeto ocidentalmente separados devido, em primeiro lugar, à separação entre corpo e espírito e, consequentemente, à demonização dos prazeres da carne. Como capturar a delicadeza do outro através do visgo, do cheiro, do suor, dos líquidos do corpo?
É chegada a hora de se escrever uma história das pornografias sob a tutela desses elementos inscritos por artistas fortes nas muitas linguagens áudio/visuais, destituindo o lugar tirano da exibição, narração e uso das genitálias como princípio motor do pornô. Voltar-se para outras intensidades do pornô – o gemido, o riso, o suor – é produzir uma história através de signos considerados tradicionalmente como acessórios e periféricos face a um centro imaginário em que o olhar se volta para formas culturalmente reprimidas, além de assumir a força discursiva de dispositivos corpóreos, porém imateriais. Essa narrativa desviante, essa aventura de pé no chão abriria mão de monumentalizar o genital quando se desinteressa por mantê-lo no campo do biológico ou do puramente artístico, sensorial, cujos discursos, ainda oscilantes à custa de não sabermos o que pode o corpo, alternam entre a sacralização e a profanidade.
Erguer um pensamento histórico a partir do prazer talvez seja o porvir e o redimensionamento de valores e práticas de prazer. O que se propõe é a possibilidade de reler obras vistas como pornográficas, instaurando a partir delas questões estéticas irreconciliáveis para as histórias da arte, além da retomada oblíqua, torta do composto cênico (personagens, cenários, texto) a fim de elaborar paradigmas, modos de relação e heranças desviantes. Pensar os gemidos, os suores dos corpos, o inimaginável, aquilo que quase nunca se fotografa, o convencionalmente banido e produzido como inexistente ou inoperante. O suor possui também sua história (lutas, colônias, transas); ele é efeito de forças. Reinventar a nossa relação com a prática/performance e pensamento sexual aparece como um possível efeito coletivo dessa outra postura histórica úmida, meio pegajosa e sônica.
Tal atitude propõe reconstituir a gramática sexual através das imagens e sensações que historicamente foram postas nas adjacências da periferia do império em que se encontram soberanas as relíquias dionisíacas – o pênis, o ânus e a vagina. Ao romper com a oposição entre o sexual e o afetivo, investindo nos incorporais, os bichos nos permitem vislumbrar formas de prazer dissidentes, além de ampliar os sítios cintilantes em que o corpo reage, vibra, se condensa. O afeto demanda a existência de um corpo para que possa exercer sua força, impondo desse modo apenas energias que se in-corporem, que mostrem assim sua materialidade. Quanto mais fluido, mais se abraça na matéria, por isso que tanto o tempo quanto a excitação, além da pele, possuem uma fisiologia na qual encontramos o peso, extensão e volume dos afetos, embora saibamos que essa dissecação não obedece aos sistemas comumente quantificáveis. Instala-se aí uma física sexual-afetiva, “um quantum de afeto ou de uma carga energética” [7], com seus paradigmas distintos.
Nessa esteira, o roçar é, para os bichos, uma forma de se relacionar, nem puro movimento nem dança, mas atrito, máquina de fricção, reafirmando uma ampla tradição dos gestos afetivos. “Quem são eles?”, perguntam. Eu respondo: o beijo, o pouso da mão, o ato de acender, excitar o corpo do outro. Faz parte inclusive dessa gestualidade afetiva deixar o outro, quando preciso, conhecendo os pormenores, a fertilidade, a terra macia de sua própria solidão.
O roçar, pois, não admite aderências, apenas trocas (temperaturas, arrepios, agitação), o ir-se ao encontro de. Como não possui substância, embora seja levemente encorpado, ninguém o maneja, molda, modela e a ninguém influencia; não se constitui nem mesmo como um signo (artifício para reduzir a extensão de forças, peça fundante sobre a qual se ergue o desejo do representar e do mesmo); contra ou a favor de estatutos sociais e políticos, o roçar assume o risco portanto de ser inventado esteticamente através de pequenos gestos e de intensidades discretas; nenhuma sensação alarmante que destitua o roçar de sua sutileza: apenas no lugar do espetáculo, o processo; no lugar do traço, esboços e rascunhos e persistências; no lugar do rosto, máscaras; no lugar da transparência do biográfico, as nossas divinas falsas verdades do dia a dia; o teatral onde se espera a ciência do sexual [8].
O teatral é, em nossa perspectiva, um gesto político que quebra com a violência inerente a toda produção do verdadeiro e do real, tanto numa determinada cena artística quanto na crítica literária, social, cultural e filosófica. O uso substantivado desses termos se torna tal como romanesco, fílmico, performático no investimento cada vez mais incisivo em mostrar no e através do discurso dito científico, que se quer representante e produtor de uma verdade, a possibilidade de ser rasurado em sua forma, em sua escrita e nas margens de seus textos pela ameaça sempre suspensiva e movediça da dissimulação, da ficção e do poder do aparente [9]. Essa dramatização do saber é uma estratégia que encontramos espraiada nas escrituras de pensadores a partir do século XIX e potencializado em textos de Roland Barthes, Michel Foucault, Julia Kristeva, Jacques Derrida, Gilles Deleuze etc.
O roçar só admite uma coleção de gestos cuja despretensão impede o observador tradicional – sedento por conteúdos e transparências – de colar, de reduzir as misturas heterogêneas do gestual pela tirania do significado. O gesto, sempre contramonumental [10] e inapreensível, instaura outras formas de cultivar-se em oposição à profundeza das praças públicas, dos palcos e gêneros, enquanto os bichos desenham um jardim de onde se vê o nascimento de uma pequena multidão, e, como tem de ser, singularizada e partilhada. Em vez de povoar os desertos como os bichos de Samuel Beckett ou de Jack Kerouac, os bichos de Karim Aïnouz são parte integrante deles: são a fome, são a sede – um do outro – por isso se bebem, se lambem, se comem, esvanecem. O roçar, como não se fixa no corpo outro, vibra porque é só experimento, poética das artimanhas, do esfrega-esfrega.
Convém ao pornô escancarar os talhos do que são formados os processos de criação, já que as práticas sexuais, quando reinventadas pelos seus agentes artísticos, mostram sua impossibilidade de serem expostas como resultado, objeto, coisa finalizada segundo o ponto de vista que prega que para a obra ser admirada, comprada, plantada em galerias e museus precisa estar pronta. Como puro fluxo, flagrante do tempo se formando à nossa frente, é significativo que Bichos Pretos Coloridos aconteça diante das matas, da cachoeira, ao ar livre, no meio desses elementos movediços, sem proporções definidas que assegurem suas origens e seus fins, ponto cintilante em que se ergue sua narrativa: pelo sedimentado, aos pedaços. Ruína de grandes elementos físicos e estéticos se formando lentamente diante da tela.
Caso haja um lugar onde caibam esses gestos, talvez nos pátios e ruas, onde nada permanece, fica intocável ou definitivamente pronto. As materialidades plásticas que ampliam o campo do pornô investem na relação com espaços abertos, intensidades de sensações e, sobretudo, numa afetividade tátil em que caiba o olhar, o experimentar e a temperatura da pele. Contra a profundidade do olhar lançada pelas artes ilusórias (românticas, expressionistas), ato que faz, nesse sentido, do corpo do outro um poço em que alguém está prestes a se afundar, essas obras produzidas no limite entre, nas bordas, nos limiares apostam no toque, na temperatura da pele, na ruptura entre pornô e arte. Por essa razão, os bichos vão além do beijo, gesto contraditório: se por um lado o beijar está comumente ausente na dramaturgia da pornografia mainstream, é sustentado em contrapartida nas representações do querer que suspendem a relação sexual de suas narrativas. Os bichos se tocam, os bichos têm pelo e se cheiram.
BICHOS TÊM ROSTO?
Os muitos elos que se ligam aos gestos levam os corpos a conviverem, a agirem sem convocar uma identidade, por esse motivo os bichos vivem sem o peso do nome, a massa dura do nome a engessar a inauguração de outros territórios, atos e sensações. No pós-pornô, o corpo desnudado torna-se ele todo uma máscara, abstendo-se de ser o espelho da alma do sujeito (e ao mesmo tempo seu poço, sua ribanceira) –, um rosto deformado pelo esforço do tentar, do agir, do experimentar; lá, gasta-se o rosto para que a partir de seus sedimentos outros se formem e diariamente se precarizem e de novo se recomponham, mediante a um exercício incansável de inventar-se através dos gestos, dos hábitos, da alimentação estética que o corpo segue acolhendo. Tudo estronda no rosto, tudo vibra nele. [11]
Não esqueçamos que os bichos vez e outra sofrem por considerarem o rosto como tecido orgânico e, sobretudo, oceânico segundo os sistemas de pensamento que celebram o segredo, o profundo, o manto, o vulcânico; não é de se estranhar o porquê do experimentar e dos saberes passarem nas pornografias pelos lábios, pelos dedos e língua, pelas frestas. O rosto é desistido de ser um lugar privilegiado da identidade, da passagem do tempo, da evidência dos erros, da expressão do pensamento, da porta de saída dos afetos. Os rostos dos bichos são tessituras sem aderências, painéis de carne escorrendo pelas pedras e reforçando as águas que por eles atravessam barbaramente.
No pós-pornô, os afetos são densamente corpóreos, vibrando principalmente no gesto – essa postura que fere o desenho dos eventos faustosos, das fortes paixões mapeadas pelas grandes narrativas. O gesto ou o aceno fazem com que os bichos deixem de se comprometer com a criação de cenas grandiloquentes e se concentrem no episódico, naquilo que acontece diante deles, que cresce, que escorre, que molha.
Convém sinalizar que Karim Aïnouz investiu, nessa obra, num projeto de desespetacularização do sexual, transformando o ato de se estar em relação com o corpo do outro quase em uma dança: nada simétrica em que os corpos assemelhados (peso, altura, etnia) esforçam-se por seguir o mesmo ritmo, a mesma frequência no risco iminente da queda e do tropeço. O tropeçar e o cair são modos de adoecimento quando não encontramos em meio a tanto movimento nossos gestos, nosso eixo. Essa estranha maneira de dançar participa de um processo teórico/ativo elaborado pela dança contemporânea, graças à ausência de padrão de corpo e de movimento coadunado ao seu gesto político de viver através de um aglomerado de técnicas e de uma heterogeneidade de formas transformando-a, sobretudo, em um projeto ético e estético [12].
Os bichos de Aïnouz [13] arquitetam com o que sobra de suas vivências políticas afetivas, em outras palavras, decidem-se pelas estampas e paisagens, prazeres e territórios que hão de compor seus dias, lançando interferências e ruídos na esfera do comum, nos espaços compartilhados. As políticas do afeto são instauradas pela singularidade de cada corpo, compostas incessantemente por suas práticas e escolhas (culturais e estéticas), o que não quer dizer que sejam condutas individuais. Caso fossem, deixariam de ser da ordem do afetivo, apenas concebível se considerarmos a lógica dos encontros e outro vocabulário que dela emerge: estar em relação, coabitar, composição, horizontalizar, partilha, porosidade, fluxos, dispersão, intensidades [14]. E o gesto se inscreve como vontade, forte querer, emaranhado de altas frequências de energia para lançar entre nós fluxos de vida viçosa, ativa e ardente.
O que chamo de gesto afetivo talvez seja um efeito da chamada virada afetiva (affective turn) [15] em que se fundamentaria um investimento cada vez mais crescente de poéticas artísticas e de um forte interesse da crítica em focar na potência dos afetos como resposta à racionalização intensificada por uma linhagem filosófica (Kant, Hegel), cujo privilégio da razão sobre as emoções destinava estas a um papel menor no conjunto das ciências humanas. As linguagens artísticas ficavam, nessa perspectiva, como materialidades menores diante de tratados de ordem crítica e teórica, suporte privilegiado por essa tradição.
Uma virada pôs em pauta a aparição de um vocabulário, teorias da arte, intervenções na esfera do comum, tendências filosóficas e epistemologias do afeto a partir de 1980, não coincidentemente no dia a dia das grandes cidades, cujo capitalismo parece ter alcançado sua voltagem máxima, demandando paradoxalmente a emergência de práticas discursivas e estéticas distintas, como estratégia política de inventar formas de vida, e não como uma técnica arcadista de fuga de uma realidade. Com a problematização em torno da representação com os estudos culturais, os afetos surgem como plasticidades estéticas, críticas e, sobretudo, de vida, para instauração de saberes e políticas na esfera comum. De posse dessas superfícies lisas, as políticas afetivas escapam, sempre que possível, das institucionalizações.
Antes da leitura deleuziana (Espinosa: Filosofia Prática) que reacenderia as contribuições de Espinosa a partir da década de 1970, Freud talvez seja uma espécie de precursor dessa cartografia das emoções, ao fazer da psicanálise um sistema de pensamento que legitima os saberes artísticos, por sua habilidade em descrever o território das paixões, isto é, aquilo que possui força na realidade do sujeito e sobre a qual falham os parâmetros de consciência e domínio de si, eixos que sustentavam o pensamento filosófico que verticalizava o racional em detrimento do emocional.
Como sujeitos institucionalmente tão frágeis negociariam esse governo de si? Lançando nos cenários do real (casa, rua, imaginário) seus corpos como apostas num porvir mais sutil, mesmo que o presente (as horas que passam) seja o terreno onde se instala o absurdo e se desfaz as químicas, as promessas, os humores. Entretanto, são nessas corporeidades que toda a engrenagem se refaz cintilante. Não há em seus personagens alegrias que não atravessem o corpo. Aqui instaura-se uma cinematografia em que os personagens desenham, no espaço movediço do comum, uma alegria, à medida que sustentam (mesmo ruindo, desmantelando-se) a vida que acham valer a pena ser vivida.
Ao invés dos sussurros forçosos e onomatopeicos um tanto indispensáveis nas outras performances sexuais, o curta de Aïnouz torna em trilha sonora o movimento das águas. Essa desdramatização chama mais para perto uma série de encenações correntes cuja vontade de mimetizar o acontecimento se esvazia em sua plasticidade, já que aquilo que conhecemos como real não é o avesso da ficção, mas constituído paradoxalmente de um quê de dramaticidade, isto é, aparências, fábulas, fingimentos, dissimulações [16]. Os bichos, quando abrem mão de fixações étnicas, sexuais, nacionais, geracionais, impedem-se, de maneira estratégica, de serem representáveis ou representados, desafogando sua gestualidade das molduras e enquadramentos. Talvez aí se encontre a restituição de uma ação/vontade/paradigma sexual retirada da esfera do comum que Agamben [17] sonhou, um dia, ser-nos reapropriada via pornografia. Profanar quer dizer, em seu glossário, dessacralizar o que fora abruptamente recolhido, guardado, distanciado do olhar público. O pornô mainstream não pode ainda pôr em operação essa barbárie, devido aos seus comprometimentos com a alta capitalização e com as políticas de produção do sexual, que impedem qualquer movimento em outras direções que não seja da fabricação de estereotipias e de suas tramas e coreografias sisíficas.
Em Bichos Pretos Coloridos há uma outra instauração dinâmica: o vagar e a disposição dos corpos (sobre as pedras, embaixo das árvores, um sobre o outro), e a lentidão [18] dos acenos/movimentos que contrapõem-se à sinfonia supersônica e às altas voltagens do ir e vir das relações nas grandes cidades. Essa lentidão, esse mais devagar desloca-se por sua vez para o território dos afetos como chance de gerar outros modos e projetos de vida. O êxtase, entrar no tempo, experiência do fora.
A água passa. Passam vultos, lascas de madeiras, tudo que tomba se transforma como se fosse cadáveres de insetos minúsculos. Observar, participando dessa passagem. Todo renovar é ação hidráulica, dizem com a morosidade dos olhos. No entanto, a postura de parada, zero grau de movimento, a força do paralisar-se criam paradoxalmente a sensação de presenciarmos esculturas em movimento, caso as entendamos como potência do esculpir a fossilização e reinvenção de gestos deixados no ar, no tempo, no inconsciente, nos espaços, nas matérias: “Criar uma escultura, é um gesto vegetal; é o rastro, o percurso, a aderência em potência, o fóssil do gesto feito, a ação imóvel, a espera […] ponto de vida e ponto de morte” [19]. Provém daí a adesão ao bicho e especificamente ao camaleão: muda seu tom e colorido de acordo com as situações: quadros em preto e branco, cor das pedras, pele.
É relevante ressaltar que seus gestos nada possuem de avassalador ou de passional, desobedecendo a performance dos afetos grandiloquentes. Cabe, entre a porosidade de um e outro apenas a ternura. Ela, como um afeto, fissura a desmedida (hýbris) aristotélica, romântica e pós-moderna. A primeira leva o sujeito a transbordar sua própria condição, por esse motivo o pensador grego celebra a forma-tragédia como dispositivo dessas emoções. A falta de medida romântica se dá no fantasiar o jogo que pouco a pouco tornar-se-á cada vez mais insustentável face às técnicas de subjetivação homogeneizantes e às condições socioeconômicas das metrópoles que impõem uma distância entre o real e o fictício, enquanto o contemporâneo encontrará no excesso (violência, sexo, miséria) um dos modos de vivenciar o desmedido, isto é, seu para além do espírito: o corpo, corpo, corpo.
Pois o terno é brando, o que não quer dizer que lhe falte alta vibração e intensidade, que tenha saúde e seja envolvente. Envolver o outro que passa pela suavidade. A ternura provém de um exercício político do corpo em querer-conviver, estar-junto, ouvir o outro. Como exercício no espaço do comum, o ser-terno figura como uma performance que inventa paisagens e as horas para se viver, privilegiando sobretudo outras maneiras de usar e comprometer-se com a linguagem; por isso mesmo o performático é multidimensional. Enquanto isso o ser-terno atende aos riscos e humores possíveis do dia a dia, pois poder ser compartilhada é da natureza da ternura. Roland Barthes, ao dramatizar os fragmentos de um discurso amoroso, nos diz (sofrendo!) que o olhar carinhoso e energizante que cai sobre um corpo que ama pode inevitavelmente ser lançado para outras direções. “Mas se eu o recebo (e pode ser simultâneo), no campo do desejo, fico inquieto. A ternura, de direito, não é exclusiva, preciso admitir que aquilo que eu recebo outros também recebem” [20].
Os gestos de ternura têm como princípio ativo não restringir-se à intimidade e a outros esquemas de teatralização do eu, fundamentos de uma prática de interiorização burguesa, já que o ser-terno se exerce para além do espaço privado e das amizades sexuais, sempre na relação com aquilo que lhe seja estrangeiro [21]. Produzimo-los como desafio biopolítico e sutura dos ferimentos urbanos, como forma de fazer o outro e a nós mesmos sobreviver, como forma comunitária de vida. Nessa esteira cai por terra toda tentativa de aproximar-se desses bichos e daquilo que vem junto com eles (cenário, corporeidade) como se estivessem em um paraíso terrestre perdido. O encontro se consuma, então. Mas não apenas para o prazer e o amor (massa de modelar e protagonistas das grandes narrativas) e sim para dedicar um ao outro pequenos intensos gestos de ternura, que desistem daqueles outros violentíssimos, cujo propósito acaba por devorar os pares, comendo-os ferozmente. Não é à toa que o romantismo moderno vê, acredita, cria e se relaciona com o tempo como um inimigo, agente corrompedor.
Desapartado de toda fragilidade e derivações românticas, o ser-terno age na esfera do cotidiano, levando em conta sua tendência ao sangue, e dá, ainda, reverência perigosa às formas do uno nas relações institucionais e afetivas, em que o corpo deixa-se ser tomado como posse (do Estado/família/empresa/amor). Em vez dessa consciência trágica diminuir seu poder ativo, transforma-se em estímulo que vai ao encontro dessas condições, sabendo não possuir soluções definitivas ou verdades únicas para realidades subjetivas e econômicas tão distintas, instaurando assim uma dança afetiva no ir e vir mais do que qualquer tipo de tendência ou movimento. Como forma de vida contrahegemônica e desviante, firma-se (cambaleando) como uma uma saída discreta pela porta dos fundos [22]. O gesto terno é poligonal, pois admite diversas formas de entrada e saída e, sobretudo, como prática de leitura, pode ser entendido assim: como uma ternura cruel, uma barbárie afetiva.
O gesto não é uma linguagem sem palavras cujos signos demandam uma tradução, mas uma forma sem língua e portanto sem enredo, sem semântica que o transforme em um poço de conteúdo à espera de um interpretante. Em contrapartida, caso ele expresse alguma coisa, é a impossibilidade de falar [23]. Por essa razão, esse mutismo torna-se dança, encenação, porque não há uma pessoa, um indivíduo ou sujeito se entregando em linguagem para espectadores ávidos por dominá-los, abocanhar suas forças através da interpretação. Essa ausência de fartura e consequentemente a fome que se instala deixa-nos diante do puro gesto [24], isto é, aquele já descompromissado com o real. Esse jeito outro de movimentar-se solicita espectadores em que o domínio do acontecimento via interpretação dê lugar às maneiras dissidentes do sentir/entender, em outras palavras, do conhecer a potência das obras através de seu poder de afetação.
Os bichos de Aïnouz cavam com os pés e mãos um não lugar onde textos, imagens e outras intervenções deixam de servir de modelo e de serem reduzidas a uma semiótica do sexual, como querem tendências historiográficas tristemente cristalizadas numa fé sobre a qual, salvo a cabeça (superior, usina do pensamento), nada de legítimo poderia ser maquinado e disparado. O pornô perturba porque desprivilegia a organização cartesiana construída hierarquicamente a partir do corpo, fazendo da cintura, do quadril, um espaço sem sentido como qualquer outro, mas na iminência de tornar-se autônomo através do uso divergente que se pode fazer deles. E os bichos fazem. E ando dizendo sim aos bichos. E sobretudo aos meus, criados por um longo tempo em cativeiros, mas livres nesta hora que passa em extensas florestas pretas úmidas, pretas, coloridas.
NOTAS
[1] Texto que integra minha tese de doutorado em Literatura e Cultura na Universidade Federal da Bahia, a partir do enlace entre pornô e as políticas afetivas.
[2] Destricted.br é uma versão brasileira de um projeto elaborado pelo curador inglês Neville Wakefield (Destricted, 2006), que reuniu artistas atuantes em muitos suportes (fotografia, escultura, vídeo, cinema e pintura) com o objetivo de mostrar a prática sexual como uma experiência de arte, aliando-a a discursos, cenas e sensibilidades nada convencionais no pornô. Dora Longo Bahia, Janaína Tschäpe, Tunga, Lula Buarque de Holanda, Marcos Chaves integram uma parte do coletivo de artistas que atuaram na versão brasileira desse projeto cuja exposição aconteceu na Galeria Fortes Vilaça (São Paulo, Brasil, 2011), e produzem dentro do que chamamos de campo ampliado do pornô. Diferentemente da versão britânica, que reuniu trabalhos de Marina Abramović, Gaspar Noé, Sam Taylor-Wood, Larry Clark, os vídeos ligados ao projeto Destricted.br infelizmente não foram lançados no circuito comercial, o que confere certo ineditismo para o público que não visitou a exposição naquele momento. Embora Bichos Pretos Coloridos (2011, 14 min) tenha sido escolhido como nosso “objeto” / ponto de partida / dispositivo deste texto, outros materiais do projeto serão citados aqui. Bichos Pretos Coloridos é uma obra em vídeo que compõe o Destricted.br e possui direção do cineasta cearense Karim Aïnouz.
[3] Patrice Pavis elenca uma tipologia do gesto na qual encontramos “os gestos inatos, ligados a uma atitude corporal ou a um movimento; os gestos estéticos, trabalhados para produzir uma obra de arte (dança, pantomima, teatro etc.); os gestos convencionais, que expressam uma mensagem compreendida pelo emissor e pelo receptor. Outra distinção consistiria em opor gesto imitativo a gesto original. O gesto imitativo é o do ator que encarna de maneira realista o personagem, reconstituindo seu comportamento e seus ‘tiques’ gestuais (na realidade, estilização e caracterização são inevitáveis e condicionam mesmo esse efeito da realidade gestual). O gesto pode, ao contrário, recusar a imitação, a repetição e a racionalização discursiva”. (PAVIS, 2008: 185)
[4] Com o objetivo de romper o pensamento que vincula o gestual à expressão de uma interioridade espiritual ou social, pensadores como Patrice Pavis defendem a ideia de que o gesto, pelo menos no teatro, é produzido pelo corpo do ator, refutando as concepções de naturalização e consequentemente de representação. (Ibidem)
[5] “Pois não haja engano acerca do método: uma mera disciplina de sentimentos e pensamentos não é quase nada (nisso está o grande mal-entendido da formação alemã, que é totalmente ilusória): deve-se primeiro convencer o corpo. […] É decisivo, para a sina de um povo e da humanidade, que se comece a cultura no lugar certo – não na alma (como pensava a funesta ilusão dos sacerdotes e semissacerdotes): o lugar certo é o corpo, os gestos, a dieta, a fisiologia, o resto é consequência disso.” (NIETZSCHE, 2006a: 97)
[6] “Mais antiga que a linguagem é a imitação dos gestos, que acontece involuntariamente e que ainda hoje, com toda a supressão da linguagem gestual e a educação para controlar os músculos, é tão forte que não podemos ver um rosto que não se altera sem que haja excitação do nosso próprio rosto (podemos observar que um bocejo simulado provoca, em quem o vê, um bocejo natural). O gesto imitado reconduzia o imitador ao sentimento que expressava no rosto ou no corpo do imitado. Assim aprendemos a nos compreender.” (NIETZSCHE, 2005: 133)
[7] SAADA-FAVRET, 2005: 05.
[8] A scientia sexualis é, para Michel Foucault, um método construído pela sociedade burguesa a partir do século XIX com o objetivo de elaborar uma verdade sobre o sexo. Em outras palavras, trata-se de uma ciência da sexualidade – mais do que um saber sobre os prazeres – em que um conjunto disforme de procedimentos e campos (da confissão, pedagogia à clínica) participe de uma expedição maior, com a intenção de que a essência do sujeito seja revelada para que intervenções de várias ordens (médicas, religiosas e terapêuticas) possam ser postas em ação visando à cura, isto é, à normatização de práticas sexuais legitimadas pelo estado-igreja-medicina. (FOUCAULT, 2011: 77)
[9] Essa dramatização do saber é uma estratégia que encontramos espraiada nas escrituras de pensadores a partir do século XIX e potencializada em textos de Roland Barthes, Michel Foucault, Julia Kristeva, Jacques Derrida, Gilles Deleuze etc. Inversamente, encontramos a forma filosófica com especial atenção na literatura (romance e drama), no entanto babelizada, conforme notamos nos textos de Marquês de Sade e Heinrich von Kleist, Albert Camus e Thomas Bernhard, por exemplo. Vale ressaltar, em contrapartida, que esse elemento filosófico talvez tenha sido o que tanto tenha perturbado Friedrich Nietzsche ao ler os princípios socráticos nas tragédias de Eurípides. “A tragédia de Eurípides é o termômetro do pensamento estético e ético-político de sua época, em oposição ao desenvolvimento instintivo da arte antiga, que chegou ao seu final com Sófocles. […] Com Eurípides surge uma cisão. Onde lhe parece necessário criticar [grifo nosso] o antigo, ele o faz com uma clareza desavergonhada”. (NIETZSCHE, 2006b: 91)
[10] O prefixo contra é usado aqui de forma tendenciosamente política na mesma esteira filosófica do contrahegemônico, contraestético quando ativa o conflito e a emergência do ato de (re)ler textos pertencentes a outras temporalidades sociais e econômicas, assim como estéticas e políticas. Caso contrário, reforçaria os sistemas opositivos (a favor ou contra, positivo ou negativo) com os quais não quero me aliar.
[11] Refiro-me à prática tradicional do money-shot nas obras do cinema pornô mainstream em que já se espera que, na sequência final, a figura “normativa”, o homem (ativo, hipermasculinizado, voraz), ejacule sobre o rosto de sua presa.
[12] Cf. TOMAZZONI, 2006.
[13] Lembro de Madame Satã (2001), a Hermila de O Céu de Suely (2006) e o Donato de Praia do Futuro (2014).
[14] Ver SANTOS, 2015: 135.
[15] CLOUGH, 2008.
[16] “A teoria da dramaturgia do real leva a conclusões óbvias – o filme feito por meio de implementação consequente dessa teoria pode ser imaginado perfeitamente. Será um filme psicológico sobre um homem, um filme com ação estritamente ficcional, realizado pelos meios do método estritamente documental. […] Uma vez que a realidade, que frequentemente nos pegamos descobrindo, é mais melodramática e dramática, trágica e cômica. É cheia de surpresas e regularidades, conflitos psicológicos e o curso, de onde pensamentos e reflexões resultam, indo muito além da imagem fotografada ou do som gravado.” (KIEŚLOWSKI, S/d)
[17] AGAMBEN, 2007: 78-79.
[18] No espaço do gestual, como poética/estética/projeto, torna-se a lentidão cada vez mais um paradigma de contestação e de ruptura contra programas de assujeitamento de corpos que esforçam-se por esculpir e habitar, na medida do possível, outros regimes temporais e inaugurar, consequentemente, outras relações com os espaços. Demorar-se mais um pouco. Ficar mais. Borrar a página. Voltar. Refazer o jogo.
[19] PENONE apud DIDI-HUBERMAN, 2009: 64.
[20] BARTHES, 2001: 281.
[21] Não esquecemos novamente da contribuição de Freud para esse debate, 1919: o mais familiar é proporcionalmente o mais estranho. Ao ler o conto de Hoffmann, Der Sandmann, Freud elabora uma teoria sofisticada sobre o dueto estranho/familiar dentro de uma perspectiva subjetiva, desdobrando o termo unheimlich (o que não pertence à casa, ao familiar). É interessante como esse pensamento, digamos assim, aparece como sintoma de um momento em que sobretudo as artes plásticas (Marcel Duchamp), a literatura (crítica poética dos formalistas russos) e posteriormente o teatro (Bertolt Brecht) estão voltados para pensar a relação de distanciamento entre obra e espectador, em outras palavras, entre as formas de produção do sentir e os modos de recepção. Distanciar-se (subjetivamente) daquilo com o que convivo sem me confundir no outro, sem me perder, a fim de poder agir com mais autonomia, talvez seja uma postura ativa contra as misérias políticas e sociais de um século aberto por uma guerra mundial e seus efeitos de massificação dos corpos. Além disso, a maldição freudiana, isto é, seu modo de desestabilizar as falsas seguranças teóricas, mostra sua força e possibilita um porvir, uma ação crítica pós-estruturalista: fragilizar, retomar, rasurar, reelaborar, conviver, potencializar textos/escritura/pensamento/máquinas de sensação através da figura do paradoxo. (FREUD, 2010: 334).
[22] LISPECTOR, 1998: 7.
[23] “Isto é, na medida em que não há propriamente nada a exprimir e nada a dizer além do que é dito na linguagem, mas deve exprimir o próprio ser na linguagem – o gesto sempre é gesto de não conseguir compreender-se na palavra, é sempre gag no significado próprio do termo, que indica em primeiro lugar algo que se mete na boca para impedir a palavra e, depois, a improvisação do ator para remediar uma impossibilidade de falar” (AGAMBEN, 2015: 213).
[24] Ibidem, p. 214.
BIBLIOGRAFIA
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PARA CITAR ESTE ARTIGO
ALVES, Moisés Oliveira. “ROÇAR (nos ‘bichos pretos coloridos’): GESTO, PORNÔ & AFETO”. eRevista Performatus, Inhumas, ano 4, n. 15, jan. 2016. ISSN: 2316-8102.
Revisão ortográfica de Marcio Honorio de Godoy
© 2016 eRevista Performatus e o autor
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